19.9.16

"JOÃO" E O “APOCALIPSE”

Dias atrás, encontrei aqui, em uma de nossas ruas mais movimentadas, com uma das folclóricas figuras de nossa cidade espiritual – ou, porventura, acham vocês que, deste Outro Lado, elas, igualmente, não existem?!
- Dr. Inácio?! – cumprimentou-me de semblante preocupado.
- Como vai, “Apocalipse”?! – perguntei apertando-lhe a mão, que estendera para mim, e chamando-o como ele faz questão de ser chamado.
- Vamos indo, Doutor.
- Muito trabalho?! – inquiri no diálogo breve que mantivemos.
- O senhor nem imagina...
E ajeitando, no corpo, as roupas, um tanto andrajosas, que fazem jus ao seu codinome, acrescentou:
- Se eu fosse Deus, ainda que por um minuto, eu acabava com o mundo...
- Mas assim, sem mais ou menos?! – insisti.
- Ah, Doutor, a Humanidade está dando muito trabalho para o João... Do jeito que a coisa está não pode continuar! Eu acabaria com tudo – transformaria tudo em poeira cósmica!...
- “Dando trabalho para o João”?!... – interroguei curioso.
- Ora, Doutor – esclareceu, com uma ponta de indignação –, para o João Capeta, meu amigo?!...
- João Capeta?! De quem se trata?!...
- Do próprio!...
- Do “Chifrudo”?!...
- Ele mesmo, Doutor! É muito meu amigo...
- Não me diga, “Apocalipse”! Eu sempre soube que você tem muitas amizades nas altas esferas, mas...
- Dr. Inácio, o senhor é um homem inteligente – ponderou, segurando-me, afavelmente, no antebraço. – O senhor quer me dizer que o João, meu amigo, não está tendo mais trabalho que Jesus Cristo no mundo?!...
- Aí eu sou obrigado a concordar com você! – exclamei, dando um passo atrás, devido ao forte cheiro de cebola que emanava de sua boca desencarnada.
- Então?!...
- De fato, devo reconhecer que, em nosso país, lá pelas bandas da Capital Federal, o João anda tendo muito trabalho – chega a ser de desanimar quem, ao que sei, até hoje, desde quando apareceu a Adão e Eva, em forma de uma serpente, ainda não havia desanimado!...
- Doutor, coitado de Jesus Cristo! Aquele povo que, um dia, ele expulsou do templo... Lembra-se?! Expulsou com um chicote na mão...
- Claro que me lembro – redargui. – Ainda trago nas minhas costas a marca da lambada que levei...
- O senhor estava lá?!...
- Penso que sim, “Apocalipse”, pois eu não tenho outra explicação para a dor que, até hoje, está doendo em mim.
- Então, Doutor, com exceção do senhor, aquele povo voltou tudinho – a coisa está pior do que antes!...
- Realmente – concordei com a figura conhecidíssima de nós outros e que, quando encarnada, vivia anunciando o fim do mundo.
- É por isto que digo, Doutor: eu não posso ser Deus, porque se eu fosse Deus por um minutinho só...
- Melhor, “Apocalipse”, que você não seja – nem você e nem eu!...
- O quê?! O senhor também?!...
E antes que o assunto desandasse e ele cismasse em me emprestar o seu megafone colorido, despedi-me do amigo, mas não sem antes lhe pedir, encarecidamente:
- Recomende-me ao João, “Apocalipse”!...

INÁCIO FERREIRA

Uberaba – MG, 12 de setembro de 2016.

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