12.3.17

Acordando as Massas

Vi no Império muitas demonstrações de pequenez. Muitos políticos utilizavam dos seus cargos públicos para benefício próprio, o povo representava, tão somente, um argumento de retórica e nada mais. Apesar, porém, desta despreocupação com o povo, tinha-se certo pudor no quanto se iria subtrair de dinheiro público. Na verdade, o que se desejava era que os privilégios privados fossem dados pelo Estado para garantir mais poder e a manutenção do status quo. Havia descaso com a coisa pública, sempre houve, mas ninguém, desmedidamente, desejaria ser chamado de ladrão diante da sociedade. Os esquemas eram, por assim dizer, mais sutis e reservados.
Num outro momento, no início da República, tinha-se um arremedo de Estado brasileiro. Era um país em formação. A ideia republicana ainda se formava e nem sei se foi configurada até hoje. Os mesmos vícios foram mantidos agora sob outra esfinge – a da consolidação das terras e a troca permanente de favores e poder para ficarem entre eles mesmos. Com a subida de Getúlio Vargas ao poder central pelas mãos de uma ditadura, o Estado começou efetivamente a ter forma, mas foi somente depois do golpe militar de 1964 que os contornos definitivos se impuseram. Algo, porém, não se modificou,  foi a utilização do Estado para proveito privado. O patrimonialismo se agigantava e se apropriava de pedaços do que era público para benefício particular. Ora, como vemos, nunca se teve muito pudor nas transações públicas e privadas, uma confundindo-se com a outra. O que ocorre, portanto, com o Brasil recente nada mais é do que o decorrer de uma grande tradição de apropriação indébita do Estado numa dimensão jamais vista.
O que foi feito, meus senhores, senão a dilapidação do País por uma classe política nojenta e sem vergonha?
É necessário que estas verdades sejam ditas com todas as palavras e não é mais para simplesmente chocar, mas é para acordar as massas.
Não se pode mais viver de faz-de-conta neste País, a não ser para mantê-lo como uma eterna promessa de uma futura grande nação, onde não se sabe quando isto acontecerá.
Todos estes descalabros servem para acordar a todos e para que se faça urgentemente uma nova legislação política e partidária, de modo que acabe de vez com estes desmandos. Creio, sinceramente, que isto não vai acontecer se o povo não pressionar ainda mais na formulação de um projeto alternativo de representação popular porque o que aí existe já deu demonstrações de falência completa.
O pouco que se fez na direção da renovação destes costumes não foi o suficiente para modificar por completo as práticas nefastas dos políticos tradicionais viciados e de toda uma corja de aproveitadores do que seja público. As empreiteiras nada mais são do que um produto desta construção nefasta, aproveitadores do sistema falido, elas em si não possuem culpa alguma, pois se não houvesse a mácula de corruptos no seio do Estado elas teriam atuado apenas nas suas prerrogativas técnicas.
Agora mesmo trama-se, nos bastidores, a manutenção dos governantes que aí estão que, se não possuem imenso lastro popular para se instalarem, guardam a defesa normativa constitucional a seu favor até que se comprovem que também – ou não – sejam podres no exercício do poder.
Renovar por completo. Ampliar os horizontes da política brasileira. Uma nova proposta de representação popular se faz urgente. Mudar. Mudar para que o povo seja agente de seu destino e não apenas um artifício para justificar as falcatruas em voga.
Este sinal de esgotamento de modelo representativo não se faz unicamente em nosso País, outros países desenvolvidos ocidentais, notadamente os presidencialistas, demonstram cansaço e urgem por mudanças cabais. É a renovação de consciências em jogo. Um novo artefato de organização popular está em ebulição. Meninos hoje que assumirão em breve os destinos da nação darão novo ar a política brasileira. O excremento que hoje surge deve ser abolido na sua totalidade e sem demora. Errarão numas propostas, mas, pouco a pouco, ajeitaremos o quadro político brasileiro com novas caras e mentes que arejarão definitivamente a política em nosso País.
Há um preço a pagar por tudo isso e todos sentem na pele tudo que ocorre, mas será da indignação de todos que nascerá a energia da renovação. É assim, meus caros, que são produzidas as grandes transformações.
Tudo há de se organizar, enquanto isto não ocorre, temperança e energia são os requisitos para enfrentar esta fase de transição em direção a nova política brasileira.
Joaquim Nabuco – Blog Reflexões de um Imortal

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